terça-feira, 15 de novembro de 2016

Another (TV)

Ano: 2012
Diretor: Tsutomu Mizushima
Estúdio: P.A. Works
País: Japão
Episódios: 12
Duração: 24 min
Gênero: Drama / Mistério / Terror



Another foi lançado na temporada de inverno de 2012 no Japão e se tornou, sem dúvida alguma, um dos animes que geraram mais polêmicas no tocante ao desenvolvimento da narrativa dos últimos anos. Introduzo o texto desta forma para já destacar que uma das grandes marcas da série foi o modo como ela criou expectativas imensas em seu lançamento – expectativas estas que, na grande maioria das discussões geradas no seu transcorrer, foram as maiores propulsoras das críticas posteriormente feitas à condução da trama.

Exatamente por esta razão, ao invés de suprimir estas controvérsias que envolveram Another, irei, propositalmente, tomá-las como ponto de partida para a escrita desta resenha. A série foi baseada em uma novel de Yukito Ayatsuji publicada em outubro de 2009, e a adaptação para o mangá ficou ao encargo de Hiro Kiyohara (lançada entre maio de 2010 e janeiro de 2012). Quando a versão para anime foi anunciada, passou de imediato a ser uma grande promessa pelo teor do enredo, declaradamente dos gêneros mistério/terror. Fãs de anime se empolgaram com a perspectiva de ver nas telas uma história realmente instigante que resgatasse com perícia os gêneros para este universo (que não aparecem sempre nas listas de lançamento sazonais nipônicas).

E o enredo de Another é dos mais estimulantes: há 26 anos, um aluno popular do 9ª ano do colégio da Zona Norte de Yomiyama morreu na véspera da formatura por motivos pouco esclarecidos. A tristeza dos seus colegas fez com que um deles tivesse a ideia de, em homenagem a ele, criar um teatro no qual todos passariam a fingir que tal fatalidade não havia ocorrido - tratando o falecido como uma pessoa viva. A proposta foi aderida em unanimidade e seria mantida até a colação de grau. Porém, a partir daí, uma série de acontecimentos inexplicáveis ocorridos em cadeia evidenciaram que tal tributo teria consequências mais graves do que se almejava.

A série salta para a primavera de 1998, e acompanhamos a chegada de Sakakibara Kouichi a cidade de Yomiyama, terra natal de sua falecida mãe. O garoto irá começar seus estudos no mesmo colégio (e na mesma sala) que foi palco daqueles eventos incompreendidos há duas décadas. Porém, antes de poder ir às aulas, é internado com uma crise de pneumotórax. No hospital, recebe a visita de seus novos companheiros de sala do 9º ano. A partir daí, começa a perceber que há um clima desconfortável rondando a região – suspeita que só se agrava quando Sakakibara conhece Misaki Mei, uma menina com tapa olho que irá alimentar ainda mais os receios do menino na nova cidade.


Se as expectativas com relação ao enredo da série eram grandes, só cresceram ainda mais quando os primeiros episódios começaram a ser lançados na TV. A tal atmosfera que preocupa Kouichi transparece com músicas sombrias e cenas lentas e de pouca movimentação. Neste sentido, a P.A Works, encarregada principal pela produção do anime, foi bem-sucedida na condução e, com exceção das músicas de abertura e encerramento que não correspondem muito com a atmosfera densa criada, de resto não há nada a reclamar nesses primeiros episódios, do ponto de vista técnico. Mas não é só de um viés técnico que Another é bem conduzido nos primeiros capítulos. A narrativa, brilhantemente arquitetada, consegue fomentar um intricado mistério que, até o episódio cinco, flui tão apropriadamente que é praticamente impossível não ser tragado pelas inúmeras suspeitas que despontam.

Até este momento da série, os comentários em diversos fóruns eram os mais positivos possíveis. A história acompanhava de perto o mangá, aclamado pelo modo como explorou o desenvolvimento psicológico dos personagens, mesmo com tão poucos volumes (foram publicados somente quatro). Falava-se até mesmo em uma possível candidata a melhor trama do ano. Então, o que aconteceu pra que Another, do capítulo seis em diante, fosse estilhaçando tudo aquilo que havia sido traçado tão adequadamente até então?

Muitas indicações foram sugeridas pelos fãs. Uma chuva de críticas foi se intensificando até que atingissem um ápice no desfecho da história – e houve até alguns que disseram que Another seria não o candidato a melhor anime do ano, mas à maior armadilha da década. Bom, irei falar brevemente de três dos principais eixos problemáticos notados que considero pertinentes em uma avaliação do material como um todo.

O primeiro deles incidiu sobre a dissolução, no anime, do terror psicológico que foi acertadamente explorado no mangá, em prol de uma abordagem de horror explícito convencional, calcado em assassinatos e mortes sanguinolentos. Esta alteração de ênfase fica ainda mais nítida nos episódios finais de Another, que perdem completamente a coerência do enredo (apoteótica no mangá) para exibir o maior número possível de cenas com mutilações e acidentes. O segundo problema, conectado ao primeiro, diz respeito à extensão da trama. Os 12 capítulos propostos parecem alargar a história para além do aceitável, gerando episódios como o nº8, que, em jargão popular, só servem pra “encher linguiça”. Por conta desta falha, a atmosfera de mistério, tratada magnificamente no início, vai se dissipando até o ponto em que não há como não questionar as escolhas do diretor. Estas decisões incongruentes afetam também a construção dos personagens em Another de duas formas complementares: do ponto de vista dos protagonistas, o foco insistente no horror e no extermínio fez com que muitos deles fossem deixados de lado, se engessando em estereótipos e tipos característicos dignos de filmes pastelão do gênero. Do lado dos coadjuvantes, tal tipificação se agrava atingindo o inaceitável - gerando seres que desfilam na tela unicamente para serem combustível de suas próprias mortes.



Por estas e outras, Another se tornou, para fãs de anime, um belo exemplar do que não se deve fazer em uma série, seja de qual gênero for. Particularmente, descarto a ideia de que ele seja dispensável como um todo. Apesar dos erros gritantes, a trama não deixa de ser um bom entretenimento, e como só possui 12 capítulos, assisti-la não será um grande desgaste para ninguém. Seus enigmas e mistérios também são bastante originais, e mesmo mal lapidados, podem ainda garantir uma experiência no mínimo interessante para o espectador. A ressalva é só para que não se veja Another ansiando por uma oxigenação do gênero terror/mistério, como Madoka Magica ofereceu para as histórias de garotas mágicas.


Thales Vilela Lelo