Alternativos: Otogi Zoshi - The Legend of Magatama
Ano: 2004
Diretor: Mizuho Nishikubo
Estúdio: Production I.G.
País: Japão
Episódios: 26
Duração: 24 min
Gênero: Aventura / Drama / Fantasia
Otogizoushi são conjuntos de contos escritos no Japão durante o período Muromachi e que deram inspiração à série com a ”Lenda da Magatama“.
O anime se passa durante o período Heian, uma era pouco retratada em animes, mas que foi muito rica artisticamente falando, e situa-se mais precisamente na cidade de Kyoto, onde a capital passa por momentos de muita desigualdade social (nem um pouco diferente dos tempos atuais). Os pobres andam pelas ruas doentes, com fome e quase nus, enquanto os nobres enriquecem e estão mais preocupados com os seus próprios narizes. O grande poder está nas mãos dos "onmyouji", pessoas misteriosas que estudam o universo em si, lidam com magia e cura e que decidem praticamente tudo na capital, pois todos os temem e os respeitam.
Abe no Seimei é o líder dos "onmyouji" que, ao ver a situação, decide que o nobre guerreiro Minamoto no Raikou, acompanhado do guerreiro Watanabe no Tsuna, vá em busca das "magatamas", que são pedras especiais que simbolizam os cinco elementos naturais (água, fogo, madeira, metal e terra) e que podem restabelecer a paz e prosperidade para todos através do Yin-Yang, o equilíbrio entre o bom e o ruim, o bem e o mal. Porém, Raikou sofre de uma grave doença e é incapaz de realizar tal missão, indo, nesse caso, a sua irmã Hikaru disfarçada de homem. E assim segue o anime, indo essencialmente nessa função: encontrar as "magatamas". Mas muita trama, mistério e surpresa acompanharão a história.
Com essa premissa, Otogizoushi não parece ser um anime incomum, a não ser pelo período em que se passa. Ora, guerreiros e samurais com grandes poderes inacreditáveis são vistos por aí em muitos títulos, e encontrar a paz nunca foi novidade em lugar algum. Mas não é por esse caminho aparente que Otogizoushi anda. Há cenas de luta sim, mas todos os personagens são normais, sem poderes sobre-humanos ou coisas do tipo (salvo dois casos, é claro). E as razões são mais políticas do que em qualquer outro anime épico.
Hikaru é forte e determinada o suficiente para cumprir sua missão, com bastante personalidade. Tsuna, grandalhão e meio desajeitado, é fiel e bastante corajoso. Além desses dois personagens iniciais ainda temos a companhia de Usui no Sadamitsu, mulherengo, mas grande guerreiro fiel; Urabe no Suetake, uma mulher bastante inteligente e que domina as técnicas de cura (remédios, não magia) e Kintarou, um menino comilão e muito forte, capaz de derrubar até um urso (uma das exceções citadas anteriormente; a outra exceção é um homem que acaba se transformando em um demônio). E por fim, porém bastante importante, temos Mansairaku, um homem misterioso que conhece Hikaru e fica encantado com a melodia da flauta dela. Ainda na história o tom de seriedade é iminente, mas também há raras pitadas de humor (sem exageros). Definitivamente não se vêem desperdícios, ou seja, o anime se mantém na essência. É bom notar também o título de cada capítulo, que mostra bem o quê o episódio vai retratar.
Antes de partir para outro assunto, é indispensável falar que o anime possui duas partes de 12 episódios e mais 2 episódios ”especiais“ logo após o final. Importante também é saber que a segunda metade nem se passa em Kyoto e muito menos no período Heian. O foco agora é a Tóquio moderna, na cidade grande mesmo, e isso realmente é um ponto a favor de Otogizoushi devido ao quesito ”inovação“. Logo no décimo terceiro episódio somos levados até Tóquio e vemos duas pessoas com nomes e aparências um tanto quanto familiares. Surpresa! Hikaru e Tsuna estão lá! Bom, não são aqueles daquela época, mas para o bom entendimento e para que não sejamos uns estraga-prazeres, é recomendável assistir a primeira parte completa.
Hikaru e Tsuna residem em uma cidade onde vários fenômenos estranhos ocorrem e os dois costumam investigar esses casos por conta própria. Até porque o irmão da Hikaru (sim, é o Raikou também) desapareceu há um certo tempo após andar investigando tais fenômenos e Hikaru anda à sua procura. Nessa busca ela começa a vislumbrar diversos fenômenos e a ver certas coisas que outros não podem ver. Mas calma, como eu disse, é assistindo que se entende e apesar dessa segunda fase parecer um clichê sobrenatural, todos entenderão e verão o quanto as duas fases estão interligadas, e perceberão que vem muita história boa pela frente.
Com essa mudança, muitos acharão tudo estranho (e de fato é). Primeiramente a Hikaru e o Tsuna antes vistos não são mais os mesmos de agora. Isso é óbvio, mas é um fator definitivo para amar ou odiar o personagem. Não espere aquela garota totalmente dedicada ao seu povo e certa do que vai fazer. Vemos uma Hikaru realmente bem adequada aos novos tempos, com ”jeitinhos“ e estigmas dignos da modernidade, onde a busca louca pelo seu irmão é tudo. E o Tsuna, bom, ele continua grande, mas não com aquela lealdade invejável de antes (como os valores morais mudaram…).
O ritmo da história em relação ao período Heian cai muito e certamente causará sono em certas pessoas, pois depois de uma fase incrível como a primeira, cheia de tramas, o que ganhamos é uma história que lentamente vai se arrastando. Igualmente decadente ficou o traço e a animação, que sinceramente já não eram grande coisa antes (embora os olhos da Hikaru antiga sejam magníficos). Em certos momentos, na segunda fase, vemos pernas gigantes em relação à cabeça, coisas desproporcionais às quais infelizmente não atentaram, sabe-se lá o porquê. Cores quase sempre chapadas em toda a série incomodam aos mais exigentes, e definitivamente a trilha sonora é um desgosto, totalmente escassa e fraca, salvo aberturas e encerramentos, que são ”aturáveis“. Fora isso, vale mencionar as características dos personagens, muito distintas, carismáticas e que, juntamente com a história apenas, conseguem segurar a série inteira, pois o resto não é de se empolgar muito.
Cheio de altos e baixos, Otogizoushi se supera, sem dúvida, no enredo firme, em que todos os episódios são válidos, inclusive os dois episódios extras que, na minha opinião, foram incríveis, superando drasticamente o final meio "água-com-açúcar" da série, além dos desenvolvedores terem tido mais cuidado na parte técnica, apesar da decadência repentina na fase ”Tóquio“. Apesar também de sabermos tão pouco sobre os personagens nessa mesma fase, somos no final presenteados com as respostas que todos procurávamos e com as sutilezas e reflexões dos episódios extras, fazendo-nos esquecer dos defeitos e centralizar nossas mentes no que a história realmente quer passar.
Marcos França