segunda-feira, 28 de novembro de 2016

One Piece (TV)

Ano: 1999
Diretor: Kounosuke Uda, Junji Shimizu, Hiroaki Miyamoto, Munehisa Sakai, Toshinori Fukuzawa
Estúdio: Toei Animation
País: Japão
Episódios: indeterminado
Duração: 25 min
Gênero: Aventura / Comédia / Drama / Fantasia


Fortuna. Fama. Poder.
O homem que conseguiu tudo isso: o Rei dos Piratas, Gold Roger.
Suas palavras finais, no momento de sua execução, enviaram as pessoas ao mar:
- Meu Tesouro? Se o quiserem, será de vocês. Procurem-no! Coloquei tudo no mesmo lugar!
Deste então pessoas se aventuram na Grande Rota em busca de seus sonhos.
O mundo então entrou na Grande Era dos Piratas


Com essa introdução (traduzida livremente por mim) se inicia o anime de One Piece (OP), baseado no mangá homônimo de Eiichiro Oda, que é serializado na Shounen JUMP. OP é o mangá mais vendido de todos os tempos no Japão e gerou, além do anime, 4 especiais de TV, 10 filmes, tendo o décimo que estreado nos cinemas japoneses em dezembro, 2 OVAs, 27 jogos eletrônicos, um card game, um drama CD, 49 singles e muito mais.

A história em si se passa 22 anos após a execução de Roger. O protagonista é um jovem pirata chamado Monkey D. Luffy , cujo sonho é achar o "One Piece", o tesouro de Roger, e ser o novo Rei dos Piratas. Mas Luffy não é um pirata normal. Ele comeu uma das lendárias frutas do demônio que, apesar de impossibilitarem quem comê-las de nadar (eles afundam feito âncoras), dão habilidades sobre-humanas às pessoas. Mais especificamente, Luffy comeu a fruta Gomu Gomu, tornando-se um homem-borracha. Ele pode esticar qualquer parte do seu corpo e é praticamente invulnerável a tiros e contusões. Sua marca registrada é o seu chapéu de palha, que ele ganhou quando era criança de Shanks, um pirata que ele conheceu na juventude e que ele admira.

Luffy viaja pelos mares em busca de aventuras, conhecendo lugares e pessoas novas, fazendo amigos, inimigos e rivais e tornando-se capitão de seu próprio bando, o bando do Chapéu de Palha, sempre com o objetivo de chegar até o fim da Grande Rota, onde se supõe que está One Piece.

Como eu disse, no caminho, Luffy conhece várias pessoas, algumas das quais entram para o seu bando, tendo cada um deles um sonho diferente que os levou ao mar. Para não fazer um “spoiler” da série, falarei apenas dos 4 que aparecem na primeira abertura. O primeiro a entrar na tripulação é o ex-caçador de recompensas Roronoa Zoro, conhecido como o caçador de piratas, cujo sonho é se tornar o maior espadachim do mundo. Ele utiliza um estilo pouco ortodoxo, o Santouryuu, que utiliza 3 espadas ao mesmo tempo (a terceira fica na boca). O espadachim do bando é sério e bem rígido, e apesar de não ser um samurai, ele leva um estilo de vida bem próximo ao de um, sempre treinando para melhorar suas habilidades. Como qualquer personagem de OP, ele possui um lado cômico, evidenciado pela suas reações exageradas às tolices dos outros, pelo seu péssimo senso de direção (ele sempre se perde) e pelo fato de ser um dorminhoco.

O próximo a entrar no grupo é Usopp, filho de Yasopp, o atirador da tripulação do Shanks que o Luffy conheceu na infância. Usopp é um garoto praticamente normal, porém é muito medroso, tipo o Eric de Caverna do Dragão, sendo constantemente acometido pela doença eu-não-posso-descer-nesta-ilha... Ele é brincalhão e está sempre fazendo bobagens com o Luffy. Mas a sua principal característica é ser mentiroso ("Uso" em japonês significa mentira), o que ele usa para sua vantagem em várias situações, inclusive em combate, já que no início da série ele é bem fraco. Além disso, ele corre bem rápido, pois era acostumado a fugir depois de contar mentiras em sua vila natal, é um inventor, bolando várias bugingangas, e é um excelente atirador, como seu pai. Seu sonho é se tornar um valente homem do mar. Quando Usopp entra na tripulação como atirador, eles ganham seu navio, o Going Merry, cuja principal característica é ter uma cabeça de ovelha na proa.

O terceiro a entrar no grupo é o Sanji. Ele é o cozinheiro da tripulação e trabalhava em um restaurante em alto-mar, de propriedade de um ex-pirata. Ele é um completo pervertido, se derretendo sempre que vê uma garota bonita. Ele, porém, é muito cavalheiro e sempre é gentil com todas as mulheres. Por ser um cozinheiro e trabalhar com as mãos, ele utiliza apenas chutes durante suas lutas, para poupá-las. Ele é bem tranqüilo e fuma bastante, parece até uma chaminé. Ele deseja encontrar o All Blue, o mar lendário onde se encontram frutos do mar de todos os grandes oceanos do mundo.

A última a entrar oficialmente, apesar de ser a primeira a aparecer e começar a navegar com o Luffy após a entrada do Zoro, é a Nami. Nami é uma ladra que odeia piratas e rouba dinheiro deles, mas no fim acaba entrando no bando do chapéu de palha. Ela é uma navegadora e cartógrafa muito competente e é quem administra o dinheiro e as provisões e dá as ordens no convés. Ela é gananciosa, interesseira e está sempre se aproveitando e extorquindo os outros, inclusive usando seus dotes femininos. Mas ela tem um bom coração e se importa bastante com os seus amigos. Seu sonho é fazer um mapa-mundi.

Por fim, mas não menos importante, temos o Luffy do Chapéu de Palha, que é um protagonista shounen clichê. Ele é comilão e abestado, mas tem um coração de leão, se colocando em perigo pelos seus amigos e apostando sua vida em seus sonhos. Apesar de ser um pirata, ele é bonzinho e não pilha nem ataca os outros, a não ser que tenha motivos para fazê-lo. Ele está sempre brincando e atrás de novas aventuras. Sendo o capitão, é ele quem decide o que a tripulação faz e para onde eles vão, e mesmo que se estressem com a sua tolice às vezes, todos o respeitam e seguem sua liderança.

As personagens em OP, tanto as principais como as secundárias, são bastante carismáticas e não raro possuem um lado sério e outro escrachado. O próprio Luffy, apesar de ser um fanfarrão, frequentemente age energicamente para garantir a segurança de seus amigos, por exemplo. Além disso, é bem legal ver como os membros do bando aos poucos começam a se relacionar entre si, como por exemplo, a rivalidade entre Zoro e Sanji, a Nami tirando vantagem do tarado do Sanji e batendo no Luffy quando o mesmo faz idiotices, entre muitas outras coisas que vão tornando a experiência cada vez mais legal.

O diferencial de OP é que, ao invés de se focar nos combates e na luta do bem contra o mal, como a maioria dos shounens de ação, ele mostra um grupo de aventureiros explorando um mundo fantástico. É claro que em todo arco existem diversas lutas, mas estas estão longe de ser o foco e, por isso, costumam ter uma resolução rápida, sem enrolações. O anime se preocupa mesmo é em mostrar os lugares novos pelos quais o bando passa, cada um com paisagem, clima, habitantes e situações diferentes. A fórmula de cada arco é basicamente a seguinte: o bando chega a uma ilha nova, fazem amigos e inimigos e se metem em alguma confusão, que motiva os combates e, por fim, voltam ao mar, deixando para trás todos os amigos e inimigos que fizeram. De quando em quando eles também têm que fugir da marinha, que começa a persegui-los à medida que eles vão ficando mais famosos e “ganhando” recompensas maiores pelas suas cabeças, pois, apesar de não serem maus, eles são fora-da-lei.


Cada arco costuma fazer parte de uma saga maior (no momento, o anime está na quinta), sendo as sagas parte do enredo central, que é a viagem e os conflitos do bando e outras coisas que eu não contarei na resenha. Esse fato, aliado à grande imaginação do Oda em criar os mais diferentes e malucos lugares, não deixa o anime cair na mesmice. Outra coisa legal em OP é que, também ao contrário dos shounens comuns, ele mostra que o mundo não gira ao redor das personagens. É comum acontecerem coisas grandes que não têm nada a ver com os heróis. Inclusive o anime faz questão de mostrar que os heróis não são os únicos piratas fortes navegando por aí. Mesmo assim, o anime dá o devido crédito às ações dos protagonistas, mostrando que eles também influenciam cada vez mais os acontecimentos do mundo.

Um aspecto forte no anime é a comédia. Como eu já escrevi, quase toda personagem em OP possui um lado cômico e isso é bem explorado, seja em gags físicas de uma personagem zoando a outra, ou do Luffy fazendo imitações dos outros. O anime também faz paródias, como uma que faz do clipe "Thriller" do Michael Jackson, e do próprio em outra oportunidade, e é cheio de trocadilhos. Inclusive, quase todos os nomes dos golpes do Zoro são trocadilhos. Por exemplo, o Oni Giri, que significa corte do demônio, mas tem o mesmo som que bolinho de arroz. Mas o estilo de humor mais presente no anime é o Manzai, estilo tradicional japonês no qual existe um cara idiota (chamado de bokke) que fala coisas sem sentido ou burrices e um cara sério (o tsukkomi) que reage apontando os absurdos do que o idiota faz, muitas vezes de forma exagerada, não sendo incomum que bata no idiota. Apesar de possuir alguns pervertidos no seu elenco e de explorar o fan service depois de um tempo (mais especificamente depois que começa a ser transmitido em HD), o anime não faz aquelas piadas características de animes ecchi, tipo alguém flagrar a mulher sem roupa e apanhar ou coisa do gênero.

O ritmo do anime é bom. Não é apressado, afinal já tem 430 episódios enquanto escrevo esta resenha, e nem enrola como muitos shounen de ação. Tudo bem que, às vezes, os produtores dão uma valorizada maior em algumas partes, mas isso é natural em animes assim. O importante é que em nenhum momento chega a ser sacal. O anime possui fillers, mas estes são bem utilizados e não estragam o conjunto da obra, porque não afetam a continuidade, já que costumam se realizar entre dois arcos, e do jeito que o Oda criou o mundo de OP, não é difícil imaginar uma “escala” para uma aventura que não existe no mangá entre arcos principais. Inclusive, existe um arco filler, o da fortaleza G8, que eu recomendo aos que só lêem o mangá, pois é muito bom.

O enredo não deixa a desejar. Ele começa devagar, com os arcos mostrando as personagens principais e situações chave do passado, já que todos os membros do bando do Chapéu de Palha passaram por algum fato trágico que formou suas personalidades. Enquanto isso, vão sendo apresentados devagar o modo como o mundo de OP funciona e alguns temas que serão recorrentes, como piratas cruéis e autoridades corruptas e truculentas. E, à medida que o bando fica mais forte, o enredo vai assumindo um tom cada vez mais épico. No ponto em que o anime está, as personagens estão muito fortes e tudo que eles fazem tem uma repercussão grande. Mesmo assim, ainda tem peixe muito maior que eles por aí. Durante a viagem, eles se metem em guerras civis, conflitos religiosos, derrotam traficantes de escravos e por aí vai.

As lutas de OP são legais e variadas, pois muitos inimigos são usuários de frutas do demônio e cada fruta é única (Luffy comeu a única fruta Gomu Gomu que existia), e mesmo os que não as usam costumam ter estilos de luta singulares. Todos os Chapéu de Palha lutam, com destaque para Luffy, Zoro e Sanji, e o anime costuma apresentar desafiantes com habilidades que rivalizem com as dos membros do bando. Mesmo assim, as lutas ainda não são das mais criativas, sendo vencidas muitas vezes na raça, e ficam devendo se comparadas com lutas mais trabalhadas como as de Hunter x Hunter ou Naruto.

Na parte sonora, o anime é bem acabado. A trilha sonora é boa, dando o tom certo para momentos de comédia, tensão, empolgação e etc. Eu gosto de quase todos os temas de abertura e de encerramento, com destaque para a primeira abertura, We Are, de Hiroshi Kitadani, que virou um clássico das anisongs. Uma coisa curiosa em OP é que a partir do episódio 284 o anime parou de ter encerramento e tem apenas uma abertura, que é bem maior que a dos animes comuns, para compensar. Os efeitos sonoros são bem arranjados e a dublagem original é muito competente, contando com profissionais bastante experientes que conseguem se soltar bastante nas partes de comédia, nas quais, como eu sempre escrevo, é onde os dubladores brilham mais.

Já a versão que trouxeram para o Brasil dos EUA é horrível. Trocaram as músicas por um rap mal feito e a dublagem nacional não só foi mal escalada como teve atuações sem o mínimo de inspiração da parte de dubladores já veteranos dos animes. Fora as censuras, como trocar o cigarro do Sanji por pirulitos e trocar armas de fogo por rifles de rolha...

O traço de OP é bem singular e causa estranhamento no início, apesar de eu conhecer gente que gosta de primeira. É um traço um pouco mais caricato, com algumas personagens tendo proporções estranhas e rostos bem peculiares, que me lembra o de mestres como Osamu Tezuka e Shotaro Ishinomori. Eu aprendi a gostar e acho legal porque cada personagem tem um design único, ao contrário da maioria dos traços nos quais o artista tem uns três rostos e varia cabelos, roupas e etc. em cima dos mesmos. Em alguns momentos o traço muda perceptivelmente, mas isso é comum em animes grandes como este. Uma coisa legal no anime é que as personagens trocam de roupa entre os arcos, apesar de cada membro do bando manter seu estilo de vestimenta. Luffy por exemplo sempre está de camiseta, bermuda e chinelos, variando os estilos e as cores. Já Sanji costuma estar sempre elegante, algumas vezes de terno e outras só de camisa social, por exemplo.

Os backgrounds são variados e têm bastantes detalhes. O uso de cores é bom, mas está longe de ser o melhor que já vi. Já a animação de OP é bem inconstante. Ela nunca é ruim, mas oscila entre o mediano e o ótimo. É sempre bom lembrar aos que irão começar que o anime já tem uma década e os episódios iniciais terão uma qualidade aquém de uma obra mediana de hoje em dia. E não serão em widescreen.

Apesar de todas as coisas boas que eu já escrevi, OP não é um anime sem falhas. Mesmo sendo bastante criativo nos ambientes que mostra e temas que aborda, inclusive alguns mais sérios, como o limite ético da ciência, o anime se baseia no tripé das séries da Shounen JUMP: amizade, esforços e vitória, com personagens que, tirando certas exceções, costumam agir de forma simplista. É claro que coisas como estas são esperadas em um shounen de ação, mas mesmo entre esses há espaço para quebrar a rotina, e OP não faz isso, por mais que use bem os clichês básicos.

O anime também peca por ter várias incongruências. Não existem em OP aqueles episódios de treinamento só para enrolar e, tirando o Zoro, que está constantemente treinando, ninguém treina no bando, mas eles ficam mais fortes a cada arco. Além disso, certas personagens fracas recebem ataques fortíssimos e sobrevivem, sendo isso usado às vezes para gerar um drama falso, pois vemos um qualquer levar um super raio e todos, inclusive as personagens, supõem que o mesmo morre. Mas ao fim do arco o cara está vivinho da silva. Aliás, esse é um dos defeitos de OP. Quase ninguém morre e, no fim, os vilões acabam ou fugindo ou sendo presos, mesmo depois de lutas aparentemente mortais. Em uma das sagas isso chega a ficar ridículo, porque muita gente é derrotada de forma a parecer que foram mortos e, no fim, tá todo mundo "de boa". Pelo menos o Oda sabe aproveitar isso de uma forma construtiva: ele costuma resgatar personagens já utilizados em arcos anteriores e trazê-los para protagonizar arcos mais novos.



One Piece é um anime shounen de ação exemplar. Quem não gosta do estilo ou não consegue agüentar animes extremamente longos deve evitar One Piece. Mas se você é fã de animes shounen de ação, One Piece é um anime mais do que recomendado. One Piece tem qualidades de sobra e não é o shounen de maior sucesso no Japão por acaso.


M4rc0 AFRL