sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Shigurui (TV)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 01/04/2009

Alternativos: Shigurui: Death Frenzy
Ano: 2007
Diretor: Hirotsugu Hamazaki
Estúdio: Madhouse
País: Japão
Episódios: 12
Duração: 23 min
Gênero: Mistério / Histórico / Violência



”Desespero para Matar“... (tradução para ”Shigurui“)

"Bushidô é um desespero para matar. Às vezes é preciso partir em dez para matar um". (Verso do livro Hagakure, 1716)

Japão, 1629, Era Edo. Tokugawa Tadanaga, em um período em que o país passa por um momento de paz, resolve fazer um torneio entre espadachins. Normalmente, esse tipo de torneio usava como armas espadas de madeira, porém desta vez seria diferente: espadas verdadeiras seriam usadas. De um lado, Fujiki Gennosuke, com apenas um braço, e do outro Irako Seigen, cego. Os mesmos rivais de um passado sombrio se enfrentam em um torneio entre 22 samurais. Apenas um vencedor, e só a morte do outro o definiria como tal. Nesse impasse, voltamos sete anos antes deste acontecimento, e uma história incrível está para ser revelada.

Definitivamente, a Madhouse é um dos estúdios de animação mais conceituados atualmente, e mais claro ainda está o fato de que Shigurui não poderia ser feito por outro estúdio além desse. A animação é simplesmente soberba, digna de se comparar aos mais caros longas. O que se vê em Shigurui é um cuidado muito especial em tudo, e não apenas na movimentação do anime em si (o que já é muito gratificante). O traço é indiscutivelmente bem-feito, sem quedas na qualidade o anime inteiro. As cores e movimentações lembram Claymore, mas sem o ritmo frenético do mesmo. A sangueira também é uma característica forte do anime, com um ”exagero“ que será explicado ainda nesta resenha, além do tom mórbido e cinza, marcante. As lutas, ao contrário de muitos animes de samurais circulando por aí, são curtas mas, ao mesmo tempo, intensas e, de certa forma, até perturbadoras. Perturbadoras porque muitas vezes, antes de desferir um golpe, vemos de uma forma inexplicavelmente atraente as ligações musculares do personagem, destacando as partes usadas durante o golpe, tudo isso com uma sensação incrível de força. Destaque também para a câmera, que ”treme“ nesses momentos, acentuando ainda mais essa sensação, além de muitas outras cenas inovadoras.

Logo no início, na abertura mesmo, vemos porque Shigurui é um anime sério, pois não há nada de moderno na música como rock, techno, metal ou qualquer coisa do tipo que se vê em praticamente todos os animes. O que há na verdade é uma música calma, típica do Japão antigo mesmo e que, no decorrer das cenas da abertura – muito bonita por sinal, sem mostrar personagem algum – se torna uma intensa música de ação perfeita para o anime (basicamente o mesmo acontece no encerramento). Ainda sobre o som, quando já se está no anime em si, as músicas são no estilo da época, com os mesmos instrumentos, causando uma imersão muito boa.

Agora que já foi introduzida uma parte dos aspectos técnicos, vamos à história.


Muito mais além em níveis de superioridade está o modo de contar a história em relação à animação. Pode parecer inacreditável acreditar nisso, mesmo depois de tantos elogios que o quesito animação recebeu, mas é verdade. Logo após os acontecimentos iniciais citados no início desta resenha, ficamos sabendo que Iwamoto Kogan é um dos samurais mais fortes do Japão e que, devido ao seu pouco tempo de vida restante, deve escolher um sucessor em seu dojô que mereça realmente ocupar a sua posição. Fujiki Gennosuke é o mais indicado para isso, já que é temido por todos devido à sua habilidade. Porém tudo acaba tomando um novo rumo assim que um visitante de um outro dojô decide desafiar Iwamoto Kogan. Seu nome? Irako Seigen. Desta premissa surge uma das melhores histórias sobre vingança e honra entre samurais.

Quase todos já ouviram falar de Kogan (ou Kouga) e Gennosuke, da lenda entre os clã Iga e Kouga em animes como Basilisk e filmes como Shinobi. Mas aqui a história foi contada de uma maneira bem diferente, portanto ninguém pode dizer que lá vem mais uma história entre os dois clãs. Boa parte da história se passa no dojo Kogan mesmo, e se passa de uma forma incrível, cheia de intrigas, mistério e sangue. É inegável não notar o evidente subjetivismo no enredo, aliás, antes de assistir é bom fazer algo parecido como em Boogiepop Phantom: estar tranqüilo, concentrado e não perder NADA, nada mesmo, pois até mesmo os insetos dizem alguma coisa. Nada é em vão, tudo significa alguma coisa.

As motivações dos personagens são justificáveis e fáceis de entender as causas de suas ações. Mais um fator diferencial em relação a qualquer anime é o fato de não haver um único personagem principal. Como personagens destacam-se:

Fujiki Gennosuke – Um homem de coração gelado, fiel ao seu mestre e dojô e possuidor de uma técnica secreta avassaladora.

Irako Seigen – O homem que desafiou Iwamoto Kogan. Lutou contra Gennosuke e Gonzaemon. Ao ser derrotado por Kogan, roga para que seja seu aprendiz. Ele é responsável por quase todos os acontecimentos do anime.

Iwamoto Kogan – Considerado um dos mais temíveis samurais e dono da Kogan-ryuu. De aparência monstruosa, apresenta estados de consciência e inconsciência. Nos dois estados ele é terrivelmente assustador.

Ushimata Gonzaemon – Um mestre do Kogan-ryuu e professor direto de Gennosuke. E com um nível de luta do mesmo nível de Gennosuke.

Iwamoto Mie – Filha de Kogan, de aparência muito bonita.

Lady Iku – Concubina de Kogan, tendo que passar por todo tipo de atrocidade enquanto Kogan está inconsciente. Tem um papel muito importante, assim como a Iwamoto Mie.

O anime em tudo é uma obra de arte, arte mesmo, como pode ser visto nas lutas, nos subjetivismos retratados e na narração. O sangue em excesso e sua vermelhidão, algo que pode se vistos como um ponto negativo para alguns, nada mais é do que a arte que o anime quer passar e, caso se note bem, verá que é necessário para dar um tom dinâmico e opressivo, pois se trata de um anime poético e baseado em lendas. O ritmo é lento, obviamente, carregado de sutilezas e cenas pesadas ao mesmo tempo. A história também não é totalmente linear, o que exige uma boa atenção e raciocínio.



Diferente de todos os outros animes do gênero, o lendário Shigurui é um deleite completo para os que anseiam por uma excelente história com qualidades em todos os quesitos. Certamente todos os animes feitos possuem um motivo próprio para ter determinado enredo, e com o tempo, a maneira de contar histórias tem que ser mudada. E definitivamente Shigurui é possuidor da nota máxima por excelência.

”Matar é fácil, mas ferir é difícil“ – Ushimata Gonzaemon


Marcos França