quarta-feira, 5 de abril de 2017

Mawaru Penguindrum (TV)

Alternativos: Mawapen
Ano: 2011
Diretor: Kunihiko Ikuhara
Estúdio: Brain's Base
País: Japão
Episódios: 24
Duração: 30 min
Gênero: Drama / Mistério



Mawaru Penguindrum, ou Mawapen, é uma série dirigida e co-roteirizada por Kunihiko Ikuhara, o diretor do famoso Revolutionary Girl Utena.

O anime conta a história dos órfãos Takakura: os gêmeos Shouma e Kanba e a sua irmãzinha Himari. Um dia, durante uma visita ao parque aquático, Himari, que tem a saúde frágil, morre, mas é magicamente ressuscitada por um misterioso chapéu de pingüim que eles haviam comprado no parque aquático. Dentro do chapéu reside uma entidade misteriosa que, em troca da manutenção da vida de Himari, pede que os gêmeos procurem o Penguindrum do título. Como adicional, cada um dos três irmãos recebe um pingüim que só eles podem ver.

Quanto às personagens, temos Kanba, que apesar de sério é um playboy nato, o que chega a causar problemas para ele. Ele é o responsável pelas finanças da família e é capaz de fazer tudo pela sua irmã, pela qual nutre sentimentos talvez fortes demais... Shouma é um garoto honesto e inocente que valoriza muito sua família. É ele quem cuida da casa. Apesar de também se importar muito com Himari e fazer várias coisas moralmente questionáveis por ela, ele se mostra menos confortável com este tipo de coisa. A Himari é uma menina boazinha que está sempre alegre e que sempre tenta ser forte, para evitar que seus irmãos se preocupem com ela por causa de sua doença. Além dos Takakuras, temos Ringo Oginome, uma garota aparentemente normal, mas que esconde um hábito bem estranho. Este hábito decorre de um objetivo que ela persegue obsessivamente. Apesar de ser meio nervosinha, ela também tem um lado mais doce. Masako Natsume é uma menina rica que é obcecada por Kanba, que foge dela como o diabo da cruz. Keiju Tabuki é o tranqüilo professor dos gêmeos, e Yuri Tokikago é uma famosa atriz de um teatro só de mulheres, como o teatro japonês Takarazuka da vida real. Finalmente, temos o enigmático Dr. Sanetoshi, sobre o qual não devo escrever para não estragar as surpresas.

Mas espere, não posso terminar de escrever sobre as personagens sem mencionar os pingüins. Cada um deles representa personalidade de um dos Takakura, com Kanba, Shouma e Himari sendo donos, respectivamente, dos pingüins número 1, numero 2 e numero 3. Sim, estes são os nomes que o Kanba deu a eles e escreveu em suas costas, para ficar mais fácil de identificá-los. O #1 é pervertido e fica sempre lendo revistas de mulher pelada e tentando olhar calcinhas das mulheres. O pingüim #2 é comilão e vive com um spray mata insetos para usar contra baratas e outros bichos. A pingüim 3 é mais quieta, usa um lacinho e faz companhia à Himari. Nas cenas mais descontraídas, é comum ver os pingüins no background fazendo alguma coisa cômica. Mas nas cenas dramáticas, eles costumam fazer algo que representa o estado de espírito de seu dono. Por exemplo, em uma cena na qual Shouma está tentando fazer as pazes com Kanba e este não quer se reconciliar, o #2 oferece doces ao #1, que prontamente os joga no chão.

Tecnicamente, o anime é muito bom. Existem algumas quedas na animação e na qualidade dos desenhos, mas isso é normal em séries de TV. O anime tem um bom ritmo. O estilo da narrativa lembra muito a série Lost, com os acontecimentos recentes sendo freqüentemente complementados com flashbacks para momentos do passado das personagens que ajudam a explicar sua motivação. Outro paralelo que se pode fazer com Lost é o uso extensivo de símbolos durante o anime. Os símbolos aparecem constantemente e criam a expectativa para o momento em que os seus significados serão revelados, o que ajuda a criar o clima de mistério do anime. Nessas horas dá para ver o esmero do diretor, o que infelizmente não tivemos em Lost. Ele sabia exatamente para quê cada flashback servia na trama e os colocava nos momentos adequados, com o mesmo ocorrendo com os símbolos. Até os locais onde as cenas se passam e as composições das mesmas são feitas para servir ao enredo. Praticamente nada é mostrado no anime sem que tenha alguma relação com a história que está sendo contada.


E ao contrário de Lost, Mawapen deixa claro desde o começo que é um conto de fantasia, possuindo várias cenas surreais e que expressam o enredo de maneira mais simbólica do que literal. Os fãs do trabalho mais famoso do diretor, Utena, sabem do que estou escrevendo. Um dos exemplos mais comuns são as cenas nas quais a entidade do chapéu entra em contato com Kanba e Shouma, levando-os para um lugar surreal e fazendo uma entrada digna de transformação de garota mágica. Aliás, essas cenas são similares em estilo às entradas da Utena no jardim dos duelos.

Usando esta forma de conto de fadas, como por exemplo toda a conversa sobre pessoas predestinadas a estarem juntas, o Ikuhara conta uma história sobre destino e sobre aqueles que tentam mudar o destino. Para isso, ele usa dois símbolos freqüentemente. A maçã, que representa a relação predestinada, e o metrô, que representa a corrida em direção ao destino. Mas esses símbolos guardam ainda vários outros sentidos dentro da trama, possivelmente alguns que eu posso ter perdido. Discutir o simbolismo de Mawapen dá pano para manga. Mas além dos temas já descritos, o anime fala, entre outras coisas, sobre família, sobre pessoas que são emocionalmente abandonadas e sobre as barreiras que impedem as pessoas de se relacionar.

Apesar de toda esta temática de alma gêmea deixar a impressão de que o anime é voltado principalmente para o público feminino, isso é algo que passa, já que, a meu ver, o Ikuhara conseguiu neste anime contemplar tanto o imaginário feminino quanto o masculino, da mesma forma com a qual ele fez de Mawapen um anime com vocação artística cheio de agrados ao público, como comédia pastelão e momentos mais sensuais.

Visualmente, o anime é muito competente, com cenários bem feitos e, principalmente, com ambientes interessantes nos momentos mais alegóricos. Também se destacam as fantasias da Ringo, que fazem referências ao já mencionado Takarazuka, aos clichês visuais e do enredo de obras shoujo e de histórias de vários gêneros. Todo este cuidado no visual fica ainda mais evidente pelo fato de as pessoas na rua serem desenhadas como bonecos que aparecem nas placas de metro, coisa parecida com o que foi feito em Trapeze. É comum também que o anime use cenas que emulam uma peça de teatro, especialmente nos momentos mais simbólicos.

A animação tem algumas falhas e existem alguns problemas no traço dos personagens em alguns momentos, mas nada que seja anormal em séries de TV e nada que chegue a prejudicar. A trilha sonora é muito boa e muito bem encaixada nas cenas. As músicas comuns são orquestradas, mas o anime é cheio de covers de músicas de uma banda de rock japonesa chamada ARB. Estes covers são meio eletrônicos e são cantados pela Double H, dupla de "idols" que existe no anime e que participa de quase todos os episódios em um formato "super deformed" nos avisos que passam no metrô. Várias das músicas de encerramento são covers do ARB. Os temas de abertura e encerramento são bem legais. Fiquei até com vontade de conhecer mais o ARB.

Infelizmente, nem tudo são flores, e mesmo com todo o cuidado do Ikuhara, Mawapen não é perfeito. Em primeiro lugar, e isso não chega ser defeito mas eu preciso mencionar, está o fato de que toda essa qualidade e todo esse simbolismo sejam usados para contar uma história que vai se desenvolvendo e chega a um ponto que é bem comum. O final também não é o que se espera de uma série com toda esta produção. Não é ruim e é coerente com o que é mostrado, mas só que eu pessoalmente gostaria de ver tudo aquilo que eu citei acima ser usado em algo mais complexo. Mas o que é sim, defeito, são as pontas soltas que o anime deixa. Existem personagens que estão lá e que parecem que vão ser importantes, mas que acabam, para parafrasear a entidade do chapéu, sem dar em nada. Também tem uma coisa que é mostrada do Shouma no final que não foi bem explicada, e o fato de o anime não explicar direito o Penguindrum e porque ele estava com quem estava. Finalmente, no final do anime as coisas atingem um certo nível de drama que eu achei exagerado, chegando a ficar piegas. Tudo bem que é o estilo do diretor, mas eu me incomodei, especialmente porque veio em companhia das coisas comuns que eu citei acima.



Mawaru Penguindrum é um anime executado quase que perfeitamente e uma aula de direção do Ikuhara. Ele é cheio de simbolismos e alegorias interessantes que acabam te levando a querer discutir o anime. Além disso, a parte visual dá gosto de ver. O Ikuhara mostrou de novo que é possível fazer um anime inteligente e artístico sem precisar jogar fora a diversão. Recomendo fortemente.

P.S: Existe uma versão da história no formato light novel, mas não sei se existe alguma diferença importante.


M4rc0 AFRL